Das reportagens mais interessantes que li nos últimos tempos. É grande, mas vale muito a pena.
"Nem todas as mulheres têm desejo, excitação, penetração e orgasmo. Mas há quem leve anos a pedir ajuda. As causas podem ir dos traumas psicológicos mais complicados ao simples uso da pílula.
(Texto publicado na Revista Única do Expresso de 9 de Janeiro de 2010)
Sexo: Quando elas não conseguem
"Nem todas as mulheres têm desejo, excitação, penetração e orgasmo. Mas há quem leve anos a pedir ajuda. As causas podem ir dos traumas psicológicos mais complicados ao simples uso da pílula.
Ainda ele só se estava a aproximar e eu já sentia dor. As minhas pernas fechavam-se como uma tesoura. "O cenário dramático" repetiu-se durante mais de doze anos sempre que Rita tentava ter relações sexuais. Agora, com 34 anos conseguiu, pela primeira vez, ir até ao fim na penetração vaginal. O prazer, esse "há-de chegar" com o tempo: "Nunca um corpo estranho tinha entrado no meu, ainda me estou a habituar."
Pôr um tampão ou fazer um exame ginecológico pode ser uma 'tortura' para mulheres que sofrem do mesmo problema de Rita: o vaginismo. Embora não seja a mais comum, a contracção involuntária dos músculos da vagina pertence ao leque de disfunções sexuais femininas que levam mulheres de todas as idades e orientações sexuais a procurar ajuda. Na maioria das vezes, ao fim de anos sofrimento em segredo.
"Ninguém ia entender. Era vergonhoso de mais para mim". Por isso mesmo, nunca em cinco anos do seu primeiro casamento Rita contou sequer a uma amiga o que se passava dentro das quatro paredes do seu quarto. "Eu sentia desejo, tentávamos de vez em quando, tínhamos carícias, fazíamos sexo oral, chegava a atingir o orgasmo, mas como ele não pedia mais, acabámos por fazer disto um tema tabu e acomodámo-nos à situação." Situação essa que acabou por resultar no fim inevitável da relação. Procurar ajuda
O problema apenas ganhou nome quando conheceu o actual companheiro que, após algumas tentativas frustradas de relações sexuais, foi em busca de respostas à Internet. A informação "era pouca", mas foi o suficiente para dar o passo de finalmente procurar ajuda. "Ele disse-me que estava do meu lado e que juntos íamos ultrapassar o problema. Acabei por ir a uma ginecologista que me aconselhou um psicólogo. Só aí percebi que não era anormal e que havia solução."
A solução chegou pouco a pouco, ao longo de quase um ano de terapia. Primeiro identificou-se o momento de associação de dor à penetração, que no caso de Rita aconteceu quando foi vítima de abuso sexual aos treze anos. Depois de aprender técnicas de relaxamento para controlar a ansiedade, Rita e o companheiro começaram a fazer pequenos exercícios juntos. Actualmente já consegue consumar a penetração do pénis e não tem dúvida: a sua vida mudou. "Não me sentia uma mulher a 100 por cento. Chegava a evitar gestos de carinho, antecipando que poderia haver sexo a seguir. Hoje já sou eu que quero. Não vou perder mais tempo da minha vida".
"Mulheres abusadas, violadas ou com primeiras experiências sexuais negativas têm mais probabilidades de desenvolverem dificuldades sexuais", explica a psicóloga Erika Morbeck. No entanto, uma educação rígida, religiosa ou com informação deturpada sobre a sexualidade também são origens comuns da disfunção sexual.
É o caso de Joana para quem a palavra 'culpa' sempre esteve presente cada vez que tentava ter relações com o namorado. "Comecei a namorar muito nova, tinha 12 anos, e os meus pais não achavam piada. Como sempre quis ser a filha perfeita fui criando a ideia de que era errado. Eu própria tinha vergonha de andar de mão dada com ele na rua."
Aos 16, quando achou que era "aceitável" ter relações sexuais, tentou e não conseguiu. "Para mim eu não tinha sequer um buraco. Doía-me e eu afastava-o. Achei que era um problema físico. Quando a ginecologista me disse que eu era normal, não fiquei propriamente feliz, preferia que fosse uma coisa que não dependesse de mim." Tal como Rita, a limitação sexual foi sendo contornada. "Fazíamos tudo o resto normalmente, tínhamos excitação, orgasmo, mas estava sempre presente aquela frustração de saber que havia mais e que eu não conseguia". A resolução chegou aos 22 anos, quando uma amiga lhe marcou uma consulta psicológica. "Entrei no consultório a achar que não tinha cura." Poucos meses depois a penetração vaginal já era uma realidade. "Até chorei de alegria. Sabia que o meu namorado ia fartar-se um dia e que eu nunca poderia vir a ter uma relação estável", desabafa Joana que, acima de tudo, ultrapassou um dos seus maiores receios: não poder um dia engravidar.(...)
Quando falta o desejo. Ambos os especialistas dizem que não se sabe ao certo quantas mulheres sofrem de disfunção sexual em Portugal. "Os estudos que são feitos têm todos muito mérito mas também valores muito díspares. Toda a gente mente sobre a sua sexualidade, mesmo em inquéritos anónimos." Contudo, a maioria dos casos que passam tanto pelo consultório de Pedro Freitas como de Erika Morbeck, são de desejo sexual hipoactivo - vulgarmente conhecido por falta de desejo - e anorgasmia, não conseguir atingir o orgasmo. Mais do que traumas psicológicos, as causas são muitas vezes orgânicas, relacionadas com coisas tão banais como a gravidez e a menopausa, o uso de alguns medicamentos ou, até mesmo, contraceptivos hormonais.
Foi o caso de Matilde, que aos 28 anos perdeu o desejo sexual, na sequência de um tratamento para o acne. "A medicação provocava-me candidíase recorrente, o que me levava a não lubrificar, sentir dor durante o acto sexual e, consequentemente, a evitar ter sexo. Ao mesmo tempo comecei também a tomar a pílula e os meus níveis de testosterona ficaram muito baixos."
Embora numa relação de apenas cinco meses, Matilde deu por si a passar semanas sem sequer pensar em sexo. "Sentia-me frustrada porque antes era capaz de passar um dia inteiro a ter relações sexuais ou a magicar coisas e agora se ele não me falasse eu nem me lembrava." Até mesmo a capacidade de ter sonhos eróticos perdeu. Ao fim de dois anos de pouco sexo, incentivada pelo companheiro, pediu ajuda. Aconselhada por um sexólogo parou de tomar a pílula, passou a usar adesivos de compensação hormonal e dois meses depois a vontade voltou, timidamente, a aparecer.
Sejam elas causas orgânicas ou psicológicas, "é muito doloroso assumir que se tem um problema sexual", reforça Pedro Freitas. (...) "Ainda há muito de cultural nisto. Há mulheres que conseguem ter interacção sexual durante anos sem desejo e, por mais chocante que seja, ainda se ouvem frases como 'tenho de fazer o sacrifício senão ele deixa-me'". (...)"
(Texto publicado na Revista Única do Expresso de 9 de Janeiro de 2010)
Versão integral aqui.
Adorei ler este texto, está bem explicito! Concordo, plenamente!
ResponderEliminarÉ sempre de salutar..que saiam textos e artigos como este...podem ajudar muitas mulheres a quererem mudar...melhorar...e curar-se...e homens a compreenderem melhor o porquê de alguns desses problemas... Adorei o artigo...muito bom...e bastante informativo...
ResponderEliminarEstá um artigo bem conseguido. O importante é mesmo o carácter informativo, pq é através de artigos como estes que muitas realidades quotidianas chegam até às pessoas, muitas delas podendo até sofrer deste problema, acabando por esclarecê-las.
ResponderEliminaré realmente um artigo fantástico!
ResponderEliminarjinhos
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ResponderEliminarComentários descabidos são eliminados.
ResponderEliminargrande artigo sem dúvida !
ResponderEliminarTabém li.
ResponderEliminarSempre que há problemas de natureza sexual, nos homens ou nas mulheres, há problemas acrescidos para encontrar uma solução.
A principal razão será a de termos sido educados para não falhar nesse domíno. Por essa razão, a dificuldade em expor a um médico os problemas que nos afligem; ou adiar a partilha do problema para encotrar a solução.
Saudações
Olá!
ResponderEliminarAdmitir que existe um problema e depois a procura de um medico/ sexologo, será o unico meio de superar este problema, mais frequente do que todos nós supomos!!!!
Beijocas
Gostei muito do texto e espero que com o texto consigas ajudar alguém.. o texto não é teu mas divulgaste-o e e é uma forma de ajudar muitas raparigas que não lêem revistas como as do expresso.. Questões como estas é que deviam ser colocadas naquelas revistas como Happy, Cosmopolitan, etc etc etc, e não as 1001 formas de seduzir, técnicas para engatar e coisas do género! ; ) ***
ResponderEliminarMuito interessante e até pedagógico. obrigada.
ResponderEliminar:O
ResponderEliminarÉ algo de muito doloroso. Amar, sentir desejo e não conseguir ter uma relação sexual completa. Felizmente, a vergonha de confessar este tipo de problemas está acomeçar a desvanecer-se . Há muitas gerações de mulheres que, mesmo sem sofrerem de vaginismo, desconheceram o que era o prazer do sexo por preconceito, vergonha e ignorância, quantas vezes com o total afastamento dos maridos que as usavam como um qualquer objecto! Cabe às novas gerações de mulheres e homens mudar este estado de coisas! Bjnhs S*
ResponderEliminarDaqueles temas/assuntos sobre os quais "ninguém" fala, e muita gente pensa em silêncio.
ResponderEliminarBeijo meu ♥,
A Elite
Ainda bem que ha entrevistas que falam destes temas..
ResponderEliminarbeijinho.
Reportagem interessante
ResponderEliminar(comentário propositadamente deixado em branco por causa da neve)
ResponderEliminarÉ uma boa reportagem, muita gente a devia ler :)
ResponderEliminarBJS**
li tudinho, adoro reportagens destas. julgo serem mesmo importantes para "abrirem" os olhos à nossa sociedade. ainda há muitas mulheres para quem o sexo é uma "tarefa", um dever de dona de casa e esposa, e que nao é algo que lhes traga prazer. nao tem nem pode ser assim.. felizmente sou o oposto disso tudo ahaha xD **
ResponderEliminarMuitas vezes pior que alguns impedimentos orgânicos são os tabus criados por educações rígidas e os traumas por a buso.
ResponderEliminarÉ muito gratificante quando após alguns meses de terapia o problema fica resolvido....
Mas existem casos que podem demorar bastante mais tempo.
Cada caso é um caso e por isso peçam ajuda, quanto mais tarde o fizerem mais poderá demorar porque mais enraizado estará o problema venha la ele de onde vier.
muito bom querida S
Já tinha lido o artigo e também achei mt interessante e objectivo.
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